A História da fundação do Pouso Alto - Bolsão em Destaque de Três Lagoas
Colunista Rudi Guimarães

A História da fundação do Pouso Alto

O distrito do Pouso Alto, distante cerca de 230 km de Três Lagoas, é uma localidade no município de Paraíso das Águas, Mato Grosso do Sul. Criado na década de 1930, já pertenceu a Três Lagoas e está ligada historicamente a cidade, pois essa região foi para onde se mudou Antônio Trajano e sua família. Inclusive, o povoado é fundado por Juscelino Ferreira Guimarães, marido de sua neta Antônia Ferreira de Mello. Nessa mesma região, concentra-se muitos dos descendentes deste influente clã.

Aquela região começou a ser desbravada no século XIX, como bem constatamos no requerimento da Fazenda Pouso Alto. Lá também encontramos os pioneiros daquela região, Francisco de Paula e Oliveira, que registrou a posse da dita propriedade na freguesia de Santana (Paranaíba) em 1856. Após a sua morte, seus filhos venderam-na em 14 de janeiro de 1925 pela quantia de Rs 2:000$000 por Juscelino Ferreira Guimarães, residente na Fazenda Barra Mansa. Esse investimento se justificava, pela mudança feita há dez anos atrás de Antônio Trajano e seus filhos para a região.

Tanto Antônio Trajano dos Santos e Juscelino Ferreira Guimarães compraram posses dos ditos herdeiros, uma vasta área conhecida como Pouso Alto. Além destes dois vultos históricos, estavam também presentes: Areolino Ferreira Ottoni, casado com a neta de Trajano; João Batista Dias e família; e os Cardoso, entre outros. Essa vasta região era banhada pelo rio Sucuriú, ribeirão Cangalha e os córregos Pouso Alto, Espraiado, do Mato, entre muitos outros cursos de água e nascentes.

Após a compra da posse, Juscelino Guimarães reuniu-se com os posseiros para requerer o título definitivo da propriedade. Na época, o estado de Mato Grosso dava prioridade aos posseiros no processo de requerimento, exigindo-lhes condições para torná-las produtivas, ficando em suas responsabilidades a demarcação das divisas. Portanto, reuniu-se Juscelino junto dos demais, contratando-se os serviços de João Augusto Cândido Wack, agrimensor que mediu a fazenda Barra Mansa de seu sogro e a fazenda Córrego Fundo do avô de sua esposa.

Ao todo a área mensurada era de 27.663 hectares, iniciando-se na barranca do rio Sucuriú, fazendo divisas com a posse do Mosquito e da Pedra. Dela dividiu-se as seguintes propriedades: Pouso Alto com 15.663 hectares de domínio de Juscelino Ferreira Guimarães e Antônia Ferreira de Mello; 5.000 hectares de João Batista Dias, com o nome de fazenda Burity; 4.000 hectares de Areolino Ferreira Ottoni e Leonor Ferreira de Mello e; 3.000 hectares restantes à José Justino Alves. O valor de contrato ficou em Rs 27:397$680, lavrado em 31 de dezembro de 1928 pela repartição de terras, minas e colonização em Cuiabá.

Para essa compra, Juscelino dispôs-se de cerca de 600 reses de herança da sua esposa Antônia, uma quantidade avultada na época. Isso demonstra o esforço do casal em amealhar terras o suficiente para uma grande criação, além de preocupar-se com o futuro dos seus descendentes. Para dar sustentação a esse patrimônio, o casal associou-se ao capitalista Cacildo Arantes, um boiadeiro que tornou-se abastado e conhecido na região. Durante anos criaram gado para o mesmo, repartindo lucros dessa sociedade.

Entretanto, anos ruins vieram e grande parte da manada morreu com uma terrível seca, pondo-lhes em prejuízo. O resultado dessa dívida colocou em causa todo o projeto inicial, impondo uma saída para que se pudesse manter parte da fazenda. Com isto, ficou acertado entre Juscelino e Cacildo a transferência de parte das terras para o mesmo, com a condição que ele voltasse parte das terras no córrego do Mateus na Véstia. O contrato nunca de facto foi celebrado, porém a área de 3.600 hectares de Juscelino Guimarães, entre o córrego Pouso Alto e o rio Sucuriú, tornou-se o centro de um povoado com o nome da propriedade.

Calculamos que isso tenha acontecido por volta de 1936, quando o impasse entre ambos eclodiu. É certo que o casal morador da fazenda, organizou a disposição do aglomerado de casas e os novos posseiros que iam tomando para si, pequenos terrenos agricultáveis. Lá ergueu-se uma capela de madeira, coberta de capim que rodeava-se de singelas casas de pau-a-pique.

Outras personagens começaram a aparecer na história do nascente distrito do Pouso Alto, com a migração de novas pessoas e a formação de um comércio local. A região carecia de uma escola que pudesse alfabetizar as crianças locais, resultando na iniciativa de Juscelino e Antônia erguer uma escola de pau-a-pique na fazenda para educá-las. Até hoje se encontra na fazenda, as antigas estruturas em madeiras roliças da primitiva escola do Pouso Alto.

Esse seria o embrião da futura escola do distrito, que durante muito tempo chamou-se Juscelino Ferreira Guimarães e, atualmente, tem por nome “Vó Neguinha”. No entanto, só depois de anos através de atividades políticas do fazendeiro, construiu-se no povoado uma escola de madeira coberta por telhas de cerâmica, sendo substituída por uma de placas de concreto, por iniciativa de seu filho Urbano Ferreira Guimarães. Há alguns anos se construiu um moderno prédio para comportar com dignidade a escola.

Também é importante acrescentar que a fazenda Pouso Alto sediou um cartório de registros civis, cujo tabelião era o próprio Juscelino Ferreira Guimarães, onde realizava-se casamentos e o registro de crianças nascidas na região. Devido a essa sua posição ficou conhecido em toda a região circundante, sendo chamado para resolver problemas de diversos gêneros, assumindo uma posição de liderança. Além de Juscelino, outro importante fazendeiro marcou a vida do distrito, seu nome era Sebastião Martins Gonzaga.

Muito amigo de Juscelino e Antônia, pertencia à influente família Nogueira e era casado com a Lucinda Cândida Dias, filha e herdeira de João Batista Dias. Mudou-se para a região após a morte de seu sogro, comprando a maior das terras que lhe pertencia. Lá passou a criar muitas reses, sendo pai de oito filhos, lá nascidos e criados. Assim como seu homônimo, tinha um papel de liderança e força, atuando conjuntamente com Juscelino.

Outros dois fazendeiros conhecidos eram Manoel Vieira, proprietário da fazenda Mosquito (cerca de 10.000 hectares) e o coronel Epaminondas Nogueira de Camargo, ex-cunhado de Juscelino Ferreira Guimarães. O segundo era proprietário da maior fazenda da região, a Pedra Branca e estava ligado a três importantes famílias: Camargo, Nogueira e Ottoni. Era casado com Mônica Ferreira Ottoni, sua prima e filha de Pedro Benedicto Ottoni e Benvinda Ferreira de Mello, sogros de Juscelino, pais de sua primeira esposa, a falecida Elvina Ferreira Ottoni.

Esses quatro nomes eram figuras centrais na política e na ordem cívica da região, em uma época em que os municípios e o próprio governo estadual careciam de receitas para manter a ordem. Cada qual entrava em consenso com os demais, desta forma uniam-se e construíram estradas e organizavam um sistema de apoio mútuo, entrelaçando-se por meio de casamentos e redes parentais.

Os tempos foram passando, e o Pouso Alto passou a ser do município de Água Clara, desmembrado a partir de Três Lagoas. Com o tempo, o velho tabelião começou a atuar menos nos destinos da região, sendo agora os seus filhos e outros personagens a decidir o futuro. Da descendência do fundador do Pouso Alto, sem sombra de dúvida, o nome que mais destacou-se na política é o de Urbano Ferreira Guimarães, enquanto que outros filhos destacaram-se na criação de gado.

Urbano Ferreira Guimarães atuou como vice-prefeito de Água Clara e chegou a concorrer para prefeito da dita cidade, defendeu como nenhum outro filho as melhorias para o distrito, que à época não tinha uma rodovia pavimentada, nem uma escola com infraestrutura apropriada, muito menos um posto de saúde. Foi resultado de seus esforços a construção da nova escola com placas de concreto, homenageando seu pai, seu legítimo fundador. Também é resultado do trabalho de Urbano, a construção da capela local de alvenaria, desta vez construída com dinheiro próprio.

No mais, é de se pontuar que foi o único dos filhos de Juscelino e Antônia a falecer com parte de terras do seu pai, chegando a criar no seu auge mais de 1.000 reses. Além de Urbano, destacamos na criação de bovinos na fazenda Pouso Alto: João Ferreira Guimarães, que por volta de 1975 criava 500 reses, mais plantação de arroz; Pedro Aparecido Ferreira Guimarães, que chegou perto de 700 reses; Oriolando Ferreira Guimarães, que produziu bananas e criava 400 reses; Antônio Ferreira Guimarães, filho de João que chegou a criar 220 reses; além de participações menores de João Narciso dos Santos, esposo de Ivonilde Ferreira Guimarães e Benites Ferreira Dutra, marido de Odete Ferreira Guimarães.

Dentro da área do distrito de Pouso Alto, formaram-se pequenas propriedades agrícolas nas redondezas, destacando-se a figura de João Benedito dos Santos, neto de Antônio Trajano dos Santos que acumulou um pouco mais de 220 hectares. No entanto, parte de terras que eram formadas por campos foram aforadas na década de 1960 para dois dos filhos de Juscelino, ao Urbano e Oriolando, uma área correspondente de 2.440 hectares. Isso deveu-se a iniciativa de ambos de construir infraestrutura necessária de represamento, que era responsabilidade da prefeitura.

Em 1979, Juscelino Ferreira Guimarães e Antônia Ferreira de Mello doaram uma área de 12.063 hectares da fazenda Pouso Alto aos seus respectivos herdeiros. Em 1981 faleceu em Três Lagoas, o fundador do distrito com 99 anos incompletos na casa de Urbano. Já Antônia, só veio a falecer em 2 de julho de 1994, também na cidade de Três Lagoas.

Atualmente o distrito desenvolveu-se e faz parte do município de Paraíso das Águas, o mais jovem a ser criado em Mato Grosso do Sul. Conta com um cemitério que homenageia o filho de Juscelino, Campo Santo Oswaldo Ferreira Guimarães; uma unidade básica de saúde com o nome de Oli Garcia Leal, fazendeiro que era bisneto de Antônio Trajano e, uma moderna escola que inicialmente chamava-se Juscelino Ferreira Guimarães, que hoje tem por nome de Escola Municipal Vó Neguinha, extensão Juscelino Ferreira Guimarães.

Distrito do Pouso Alto, originalmente publicada no Correio News:
Inauguração da primeira escola no distrito, com a presença do tabelião Juscelino e de sua esposa Antônia.
Foto aérea da Fazenda Pouso Alto, com a antiga residência de Juscelino Guimarães e dona Antônia Ferreira de Mello, fonte: Marcos Roberto Guimarães Silva.
Convite da inauguração do novo prédio da escola em 25 de março de 2017.
Árvore genealógica de Juscelino Ferreira Guimarães e Antônia Ferreira de Mello, constando os seus filhos e ascendentes. Chamamos a atenção para a ligação com famílias de relevo na região e figuras históricas, como o fundador de Três Lagoas e um dos fundadores de Paranaíba.

Fontes de Informação;

  • Requerimento da Fazenda Pouso Alto.
  • Requerimento da Fazenda Córrego Fundo.
  • Requerimento da Fazenda Barra Mansa.
  • Entrevistas com membros da família Guimarães: João Ferreira Guimarães, Adelaide Teodora dos Santos, Ronan Guimarães Santos, Antônio Ferreira Guimarães, Urbano Ferreira Guimarães e Ruth Narciso Guimarães.

Colunista: Rudi Matheus Resende Guimarães nasceu em 05 de julho de 1995 em Três Lagoas. É tetraneto do fundador de nossa cidade e se formou em História pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Atualmente é mestrando em Estudos Medievais, e reside em Matosinhos, Portugal.

Botão Voltar ao topo