Rostos cobertos por grossas crostas de cicatrização, com trechos em carne viva, inchados e rosados. Este é cenário comum em um viral de beleza que tomou o app de vídeos TikTok este mês: o chamado peeling de fenol, técnica já conhecida no meio da prática estética mas cuja recuperação grotesca (resultado de promover uma descamação radical da pele) chamou atenção online.
A técnica visa atacar rugas e cicatrizes de acne a grosso modo forçando a pele do rosto a realizar uma troca profunda, através da produção de colágeno. São sessões de aplicação de um ácido realizada de forma gradual e em pequenas dosagens no rosto, com aplicação prévia de anestesia. O valor pago pelo peeling pode flutuar entre 10 mil e 30 mil reais no caso da aplicação no rosto inteiro, e 7 mil a 12 mil em áreas localizadas da face.
Especialistas apontam que a técnica é mais indicada para pessoas mais velhas, não elimina 100% dessas marcas, e que peles morenas podem não se beneficiar dela, por deixar partes da tez mais clara que outras. Além disso, o período de recuperação pode durar meses e ser incômodo ou dolorido ao paciente.
Mas esse peeling extremo pode afetar mais do que apenas um rosto marcado. O fenol que dá nome a procedimento, também conhecido como ácido fenílico, “é um composto que é tóxico e corrosivo se usando em altas concentrações. Sua toxicidade depende da dose, da exposição e duração”, diz Sobre Bruno Lages, dermatologista da Clínica Dr. Otávio Macedo & Associados, de São Paulo, membro titular da Sociedade Brasileira de Dermatologia e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica.
“A absorção do produto em altas doses no organismo pode afetar o sistema nervoso central, o sistema cardiovascular, respiratório e renal“, conclui Lages, que diz não realizar o procedimento em sua clínica e aconselhar alternativas mais seguras, como tratamento com aparelhos a laser, microagulhamento ou aplicações de ácido hialurônico.
“O fenol pode causar alterações no coração, no rim e no fígado. O procedimento, quando feito em pequenas áreas do rosto, pode ser realizado em clínica”, diz. “Já quando é a face toda, a indicação é que seja realizado em ambiente hospitalar devido a estrutura de equipamentos para acompanhar as condições cardíacas do paciente”, conclui. Pessoas com histórico de doenças nesses órgãos ou com propensão a desenvolver cicatrizes queloides correm maiores riscos com esse peeling.
A recuperação, a se considerar os vídeos de TikTok, também não é assunto simples. Ela pode levar três meses, diz o especialista, e o resultado final pode não aparecer até meio ano após a sessão. Vermelhidão, sensação de queimação e inchaço, além do risco de infecções, manchas temporárias e (em alguns casos) cicatrizes queloides, são companheiras do longo processo.
O sol, no entanto, é proibido nesses meses. “Durante a recuperação, o paciente fica isolado do ‘mundo externo’, para evitar eventos adversos ao tratamento, também devido à pele sensibilizada, e à formação de crosta na face, que pode impactar na autoestima. Por isso, pessoas com tendências ao estresse físico e mental também devem evitar realizar o procedimento e procurar tratamentos menos invasivos”, sugere.